Um Amor do Passado Nome[E D Almeida]




Vou fazer este verso e o entregar. ao correio;
ele é a carta que escrevo a um amor do passado.
- Endereço não tem - e o meu maior receio
é que não chegue nunca e se perca no meio
da viagem, sem achar a quem foi destinado...

Escrevo-o muito embora - é que hoje necessito
recordar tempos bons quando eu era feliz,
- e ao pensamento vem enquanto assim medito,
um passado distante intérmino e infinito
que guardei para mim nas memórias que fiz...

Vou tentar, meu amor... (perdoa-me se ainda
quero chamar assim ao que não volta mais...)
- vou tentar revolver uma lembrança linda
que em meu peito não morre e em minha alma não finda
e ao meu viver de agora um sorriso me traz...

Não te lembras, bem sei... - não importa, no entanto,
tão feliz hás de ser que hás de julgar-me um tolo...
- mas eu que vivo sempre a amargar o meu pranto
que fiz da minha vida um grande desencanto
encontro na lembrança dele algum consolo...
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Mas, não... não devo mais procurar o romance
onde este amor ficou como uma flor sem vida...
Que a minha alma sozinha e plácida descanse
e guarde a flor que lembra uma indecisa nuance
- antes que ela desfolhe essa ilusão querida...

Não devo revolver cinzas quase apagadas
nem uma brasa extinta ao meu sopro atiçar...
Depois... a minha vida e a tua, hoje afastadas,
jamais hão de se unir: são folhas desgarradas
que nunca ao mesmo ramo hão de poder tornar...
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Perdoa-me portanto esta carta, se acaso
algúm dia ela for parar em tuas mãos...
Ninguém sabe quem és... e assim, não faças caso,
ela é o raio de luz de uma ilusão no ocaso
e o sepulcro final dos meus desejos vãos...